“Porventura, não pertencem a Deus as interpretações?” Gn 40.8
“Dois peixinhos estão nadando e cruzam com um peixe mais velho que vem nadando no sentido contrário, que os cumprimenta dizendo: ‘bom dia, meninos, como está a água?’. Os dois peixinhos continuam nadando por mais algum tempo até que um deles olha para o outro e pergunta: ‘água? Que diabo é isso?’”[1].
Interpretar a realidade de maneira correta não é tarefa simples em um mundo submerso no pecado. Às vezes, parecemos esses jovens peixinhos: completamente alienados em relação ao que nos cerca.
Esse problema consiste no fato de sermos hermenêuticos por natureza – ou seja, criados por Deus com a capacidade de identificar e compreender a realidade à nossa volta – e estarmos agora intoxicados pelo “veneno da serpente”. Desde o dia em que Eva acreditou no “é certo que não morrereis” do diabo (Gn 3.4), o problema se desencadeou. Essencialmente, o que Satanás fez foi dar à Eva uma forma autônoma e, portanto, idólatra, de identificar e compreender o mundo, contrária àquela estabelecida pelo verdadeiro Deus (“certamente morrerás”, Gn 2.17). Em um instante, estava instaurado o caos hermenêutico no mundo, e o veneno da serpente passou a correr no sangue de toda a humanidade.
A partir daí, começamos a interpretar a realidade de maneira distorcida, adulterada, por causa de nossa própria corrupção. O pecado desfigurou nossa capacidade original de enxergarmos a Deus, o próximo e a criação de maneira íntegra. Na prática, isso significa que ficamos inclinados a ler toda a realidade não mais pelas lentes límpidas e precisas do Criador, como deveria ser, mas pelas lentes deformadas e ofuscadas de nosso coração corrupto e enganoso (Jr 17.9).
Em vista disso, como saber se nossa visão de mundo está coerente com a realidade criada e sustentada por Deus? Como ter certeza a respeito do que as coisas de fato são, uma vez que eu não consigo mais interpretá-las sem a corrupção do pecado? Como conhecer verdadeiramente a Deus e a nós mesmos? O fato é que o veneno da serpente tinha tudo para ser uma doença incurável, que conduziria toda a humanidade à perdição eterna. Seríamos cegos guiando cegos rumo ao abismo. Seríamos… se não fosse o próprio Deus providenciar a cura para todo o mal no sangue do Cordeiro.
A Verdade encarnada de Deus – Cristo –, sua obediência completa e perfeita à lei, seu sangue derramado na cruz, assumindo a culpa e a pena no lugar dos pecadores e sua ressurreição mudaram a história – e o coração! – daqueles que pela fé creem em seu nome. Pelo sangue do Cordeiro o veneno da serpente está sendo dia após dia neutralizado na vida dos cristãos. Em breve, será completamente erradicado (1Co 13.12).
Para os que creem em Jesus não há mais caos hermenêutico. Nossa cegueira espiritual foi tratada e, a partir da verdade registrada, a Escritura, temos lentes confiáveis para conhecermos a Deus, nós mesmos e o mundo que ele criou. É possível, portanto, termos convicção a respeito da realidade, não porque a enxergamos de maneira perfeita, mas porque aquele que a criou e a sustenta nos diz o que ela é, por meio do seu Espírito que habita em nós e nos ilumina para interpretá-la adequadamente através de sua revelação geral, na natureza, e especial, nas Escrituras Sagradas (Sl 19).
Enfim, como colocou José: “Porventura, não pertencem a Deus as interpretações?” (Gn 40.8). Sim, pertencem. Todas elas. E graças somente a ele por isso. Do contrário, estaríamos todos perdidos.
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