Dois mecanismos psicológicos que nos mantêm presos em um ciclo de neurose que se retroalimenta pela culpa. Na compensação, achamos que a vida nos deve alguma coisa. Estamos sempre no vermelho. Então, achamo-nos no direito de cobrar e reparar o prejuízo. Compensamos, assim, o que nos falta. Podemos compensar na comida uma carência que não foi suprida. Exemplo: “Meu chefe é tão injusto comigo que acho que tenho o direito de tirar alguma vantagem dele sem que ele saiba.” Isso é compensação. Com este mecanismo, tentamos driblar nossa consciência, convencendo-nos de que é justo reivindicar nossa parte, mesmo que isso represente o prejuízo do outro. Apesar disso, o fantasma da culpa invariavelmente volta a nos assombrar, senão no tribunal da consciência, nas masmorras do inconsciente.
Na gratificação, a lógica contábil permanece. A vida nos deve não pelo que deixou de nos dar, mas pelo bem que fizemos. Permitimo-nos certas estripulias durante determinado dia por havermos nos comportado bem nos demais dias. Isso é gratificação. Em vez de um tempo sabático, instituímos um tempo safádico. Exemplo: “Tenho sido um marido tão dedicado. Acho que mereço me divertir um pouco por aí.” Mas a culpa sempre nos acha, e de calça arriada.
A lógica do evangelho rompe com esta lógica na medida em que compreendemos que não somos devedores à carne (Rom. 8:12). Se abrimos mão de algo, fazemos exclusivamente por amor. Se perdoamos uma falta, também o fazemos por amor. De modo que ninguém nos deve nada, nem nós mesmos nos devemos coisa alguma. Estamos quites com a vida, e ela, quite conosco. Vida que segue, sem cobranças, sem interrupções.
Nenhum comentário:
Postar um comentário