sexta-feira, 6 de janeiro de 2017
A NOTICIA
O vento soprou, forte o suficiente para que as janelas batessem, mas desde cedo a mudança de tempo se prenunciava. Maria sequer levantou os olhos do papiro que falava da vinda do Messias.
Era sexta-feira e, no dia seguinte, iria bem cedo à sinagoga. Queria perguntar ao rabino algumas coisas.
"Uma virgem conceberá", como estava no trecho que estava lendo, a deixou intrigada.
Ela se perguntava como podia ser aquilo. Preferiu não perguntar à sua mãe. Dona Ana nunca se interessou pelos estudos. Certamente, o rabino da sua pequena sinagoga lhe daria as explicações. Simeão sabia tudo sobre os antigos escritos hebraicos, sobretudo sobre o que dizia o grande profeta Isaías.
Era perto da hora sexta e a comida estava pronta. Assim que seu pai e seus irmãos chegassem, almoçariam. Ela e sua mãe comeriam depois.
Foi enquanto esperava que se assentou um pouco para ler o papiro que o seu pai guardava num jarro de cerâmica, junto com outros. "Seu" Joaquim gostava de ler, mas não sabia muito. Teria mesmo que esperar para conversar com Simeão.
Enquanto aguardava para servir a refeição, ouviu de novo um ruído. Agora, não era o vento. Ela estava sozinha em casa. Sua mãe tinha ido costurar na casa de sua prima Raquel, quatro casas adiante na vila de Nazaré.
A porta estava aberta quando alguém bateu. Foi atender. Era um homem. Não o conhecia, mas se vestia como um rabino. Em pé, na porta, sem entrar, ele olhou para a menina, aparentando uns 17 anos de idade, e disse coisas que lhe soavam difíceis.
-- Paz. Trago um boa notícia, minha filha.
O rosto dela parecia queimar. O que era aquilo? Quem era esse homem? Se seu pai estivesse em casa...
-- Trago uma boa notícia. Fique tranquila. Você não leu que "uma virgem conceberá"?
-- Li -- titubeou Maria.
-- Deus escolheu você. Você ficará grávida e deverá dar ao seu bebê o nome de "Jesus".
-- Impossível, senhor. Impossível. Estou prometida a José, com quem vou me casar, mas ele nunca sequer beijou. Nunca vou envergonhar a casa do meu pai.
-- Fique tranquila, Maria. Você não ficará grávida de José, mas diretamente do Espírito Santo de Deus.
-- Não, não entendo.
O visitante continuou:
-- Digo mais. Sua prima Isabel já está grávida de Zacarias.
-- Não é possível. Ela não pode ter filhos.
-- Não podia, minha filha. Ela já está no sexto mês. Você acha que existem coisas impossíveis para Deus?
-- Não posso dizer mais nada, senhor. Só posso esperar que se realize em mim a palavra que o senhor está me dizendo. Sou uma serva do Deus de Abraão, Isaque e Israel.
O rabino pediu licença, deu meia volta e desapareceu. Maria ainda pôde vê-lo sumindo no final da rua, algumas casas acima.
Ela estava nesse estado de choque quando sua mãe chegou.
-- O que houve, minha filha?
-- Eu estava lendo no papiro uma promessa de que o Messias vai nascer de uma viagem.
Ana cortou:
-- Depois, conversamos. Seu pai deve estar chegando para o almoço, junto com os rapazes, cheios de fome. Você vai à sinagoga amanhã?
Era melhor mesmo ir. E era melhor se calar por agora.
E foi para a cozinha.
A tarde, mesmo com os afazeres da casa, foi longa. Mais longa foi ainda a noite escura. Nazaré pareceu ainda mais silenciosa. Num certo momento, perto da quarta vigília, a moça levantou-se da cama, abriu a porta e olhou para o céu, como se orasse, como se pedisse alguma explicação. Nada ouviu senão um latido distante.
Quando a manhã chegou, Maria estava pronta. Teve que esperar pelos irmãos. Foram todos.
Tudo transcorreu bem. Simeão pediu a um de seus irmãos, Davi, para ler a Torah, que lhe foi entregue aberta em Isaías 53, que falava não do nascimento, mas da morte do Messias.
Quando tudo terminou, ela falou com Joaquim:
-- Pai, preciso falar um pouco com o rabino.
Quando, em pé num canto, Simeão a recebeu, ela lhe contou a história da manhã anterior.
-- Não sei o que pensar, não sei o que fazer, não sei o que dizer.
Simeão olhou bem para ela:
-- Maria, o Messias está chegando. A mensagem do anjo é clara.
-- Que anjo, rabi?
-- O anjo que esteve com você ontem.
-- Anjo?
-- Sim, Maria, foi um anjo que esteve com você.
-- Então, eu vou ser mãe do Messias?
-- Vai.
Lágrimas se formaram sob o olho direito, mas ela as enxugou. Era preciso guardar essas coisas no coração.
-- Vou precisar de sua ajuda, senhor. Como vou dizer isto aos meus pais? Como o pessoal de Nazaré vai me ver? E José? Acho que ele vai me deixar.
-- Minha filha -- disse Simeão -- conte comigo e você não pode demorar.
-- Não posso.
"Não posso, não", repetiu para si mesma e se juntou à sua família de volta para casa. Em silêncio.
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