sexta-feira, 31 de outubro de 2025

CONHEÇO

 Conheço, logo existo

“Fiz aliança com meus olhos; como, pois, os fixaria numa donzela?” (Jó 31.1).
Certamente, em todo Antigo Testamento, o que regrava os pactos e acordos entre homens eram as alianças. Por meio delas, se estabeleciam os deveres e direitos das partes contratantes, bem como, as punições por qualquer eventual quebra. Fazer aliança consigo mesmo demonstra a dualidade que existe em todo ser humano. É comum a cada homem caído certo dialogismo, projetar um outro “eu” como que para fora de si, a fim de conversar consigo mesmo. Por esse meio exortamos a nós mesmos, parabenizamos a nós mesmos, fazemos perguntas a nós mesmos.
Um meio extremamente abençoador do uso dessa dualidade do ser é estabelecer conosco mesmo compromissos inalienáveis, aquilo que Jó chamaria de aliança. Destaca-se como importante estratégia para vencer pecados e desafios. No entanto, compreendamos que não se trata de simples compromisso pessoal, cujo sucesso está vinculado às forças humanas, mas o resultado de uma vida de profunda comunhão com Deus. Aqueles que buscam o Senhor dessa forma certamente terão o domínio próprio necessário para fazer cumprir os compromissos de santidade e serviço assumidos consigo mesmos, na presença de Deus.
O homem foi feito para conhecer. Todo ser humano é atraído pelo saber. René Descartes, filósofo francês, eternizou a asseveração: “penso, logo existo”. No entanto, pode-se dizer que é o conhecimento, resultado do pensamento, que realmente atrai o homem e o leva a “existir”. Por isso, é possível dizer que a máxima que rege o homem atual é: “existo, logo penso”. Assim, entendamos que quando falamos de “conhecimento” não se especificam verdades científicas, mas toda forma de saber.
É provável que uma dona de casa ou um homem que trabalha em um escritório não se interessarão por astronomia, apesar de haver dentre eles também aqueles que acharão fascinante tal conhecimento. Uma receita que ainda não se sabia é conhecimento; aprender um novo drible no futebol é conhecimento; usar novo cálculo tributário é conhecimento; descobrir um percurso que evite o trânsito no horário de rush é conhecimento; assim como as ciências humanas, exatas e biológicas, toda tecnologia e as matérias para a criança no ensino fundamental, são formas de saber.
O conhecimento de uma pessoa não apenas constrói sua identidade, mas está ligado à sua própria personalidade. Colocando isso de outra forma, há pessoas que se interessam mais por determinadas coisas do que por outras. Há algo inato, constituinte de sua personalidade, que a levará a conhecer coisas que são mais palatáveis às suas próprias inclinações. O grande problema do conhecimento é que ele não está mais ligado a apenas às coisas santas e aprovadas, mas passou a ser conhecimento do mal. Desde o momento da desobediência de Adão, o ser humano fez a transição do bem para o mal. Tornou-se egoísta, ensimesmado, um deus voraz que se coloca como centro e objetivo de tudo aquilo que faz.
Assim, surgiram também os saberes viciantes. Toda sensação é também conhecimento em certa medida. Pode-se dizer, que são conhecimentos sensoriais, experimentais. Conhecer o toque, as sensações, podem cativar de tal forma um indivíduo que o leve a buscar tais coisas constantemente, não admitindo qualquer privação quanto a elas. A compulsividade por comida também mostra um conhecimento sensorial arquivado na alma, a sensação de sentir-se mais do que saciado por alimentos, um vício.
Quando falamos de conhecimento, a curiosidade é um grande perigo. Conquanto possa assumir o papel de algo como uma “mola-mestra”, importante para novas descobertas, também pode ser uma tremenda e inescapável armadilha. Até a sabedoria popular chegou a essa compreensão: “a curiosidade matou o gato”. O curioso é alguém que não sabe dizer não à própria vontade de conhecer, de desvendar um mistério para sua própria compreensão.
No entanto, a curiosidade muitas vezes se mostra imprudente, não sábia, metendo os pés pelas mãos e colocando a carruagem na frente dos bois. O resultado, com frequência, será catastrófico. Há pessoas que são atraídas exatamente pelo oposto, pelo erro, não por necessariamente gostar deles, mas por não conseguir se privar do conhecimento também deles. Têm que experimentar todas as coisas. Certamente, se exporão a práticas e situações que trarão enorme malefício a sua vida.
Lembremos que conhecimento é poder, e poder fortalece o senso da autonomia humana. O homem se sente fortalecido ao desbravar todos os caminhos, a conhecer todas as experiências, a expandir os percursos de sua alma, ainda que seja necessário transitar e habitar lugares sombrios. Não há maior senso de autonomia e soberania da vontade do que permitir-se o mal, autoafirmação de que faz o que bem entende. É o conhecimento que elegeu para si mesmo, sua autonomia, sua própria soberania, sua existência. Sente-se maduro ao sentir-se desgastado no corpo, envelhecido, bem como, nas cicatrizes na alma retalhada em tantos embates desnecessários e danosos.
As palavras epigrafadas de Jó nos chamam a atenção quanto a isso. Como homem casado, afirma que estabeleceu um pacto consigo mesmo: controlar suas vontades, a fim de não pecar. Colocar um freio em sua sede de experiências. A visão é, possivelmente, a principal via de conhecimento para o ser humano. Pelos olhos lemos os escritos, assistimos imagens, contemplamos coisas mesmo ao longe, e aprendemos. Por meio dos olhos, somos capazes de projetar sensações, percebemos sutilezas do subjetivo do comportamento humano. Os olhos são capazes até mesmo de transmitir mensagens para serem decodificadas por outros olhos, olhares enamorados.
Portanto, a declaração de Jó afirma o cuidado que devemos ter com o conhecimento. Bom seria se o homem colocasse limites às suas experiências de conhecimento, que canalizasse sua sede de informações e sensações apenas àquilo que realmente lhe traga benefício eterno. Somos como recipientes do saber informacional e experimental. O grande problema é que há “homens sem tampa”, pessoas que não controlam sua própria curiosidade, como já dissemos. Despertam-se sempre para o novo e o desconhecido, não importando necessariamente o que seja. Jó sugere “tapa-olhos” sempre que necessário, ou seja, negarmos a nós mesmos experiências e informações que resultem conhecimento nocivo.
Ao invés de andarmos “destampados”, precisamos nos alegrar e nos satisfazer exclusivamente nas coisas santas. Canalizemos toda nossa energia e tempo para conhecer apenas o que é aprovado, sempre em função de Deus e de sua glória. Todo conhecimento à parte do Senhor é trevas e resultará sofrimento. Que os nossos olhos sejam luminosos, acostumados apenas com o bem. Certamente veremos Deus em tudo, a fonte do sumo bem. Que bênção maravilhosa é essa. Tenha um excelente dia na presença de Jesus (Rev. Jair de Almeida Junior).

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