A família é alvo de ataques desde que o mundo é mundo. As análises sociológicas feitas atualmente se esquecem desse fato incontestável.
Sim, a ideologia do ABC é um problema; sim, a cultura da morte é um problema; sim, a falta de virtudes nos próprios cônjuges é um grande problema.
Mas vale lembrar que a família, no mesmo momento em que foi criada por Deus, já sofreu uma bela investida da serpente. Havia ali algo de profético quanto aos ataques.
A narrativa do Gênesis, da criação à queda – portanto, capítulos 2-3 – é muito forte.¹ São João Paulo II, em sua Teologia do Corpo, afirma com muita razão que o Gênesis é uma fonte antropológica inesgotável e deve ser frequentemente visitada. Afinal, ali estão as palavras do próprio Criador quanto à sua criação.
No entanto, antes de nos debruçarmos sobre a queda e seu significado, acompanhe-me o leitor na descrição do significado da criação.
A narrativa da criação é simbolicamente riquíssima: o homem é criado do barro e Deus lhe insufla o sopro da vida²; depois de criado, Deus dá o primeiro de todos os mandamentos ao homem (não comer do fruto da árvore que está no centro do jardim), cuja desobediência tem por consequência a morte³; cria, a seguir, os animais, como uma primeira forma de dar companhia ao homem⁴; cria, por fim, a mulher, uma auxiliar correspondente, formando, então, o matrimônio como parte constituinte da natureza humana.⁵
Cada um destes aspectos corresponde a um sentido muito profundo da natureza do homem.
O primeiro aspecto descrito no ato criador de Deus – modelar o homem do barro e insuflar o sopro da vida em suas narinas – corresponde ao fato de o homem ser dotado de matéria, porém não ser caracterizado absolutamente por ela. Deus dá ao homem um espírito.
O sopro corresponde ao que o versículo 27 do primeiro capítulo chamou de “Imagem e Semelhança”: temos aqui uma descrição simbólica do que o homem objetivamente é.
O segundo momento corresponde a uma primeira aliança entre Deus e o homem. O tema da aliança aparece em vários momentos da Sagrada Escritura⁶ e em cada um deles os termos estabelecidos na aliança servem a uma mesma finalidade: firmar a comunhão entre Deus e o homem.
Aqui, portanto, não deve ser diferente. Para que o homem viva no paraíso, ele deve cumprir um preceito simples: não comer do fruto da árvore da ciência do bem e do mal.
Simbolicamente, esta aliança significa uma comunhão perfeita entre Deus e o homem. Perfeita porque foi estabelecida antes da queda, ainda no paraíso terrestre.
Os outros dois momentos da criação formam uma espécie de unidade. O que está em jogo é a solidão do homem⁷. A primeira resposta de Deus à solidão é a criação dos animais.
Porém, o homem não encontra ali uma auxiliar que lhe corresponda⁸. O texto bíblico lida, aqui, com um símbolo fortíssimo: o ser humano não foi feito para se relacionar da mesma forma como os animais o fazem. Por esta razão, Deus cria a mulher
“Mandou, pois, o Senhor Deus um profundo sono a Adão, e, enquanto ele estava dormindo, tirou uma das suas costelas, e pôs carne no lugar dela. E da costela, que tinha tirado de Adão, formou o Senhor Deus uma mulher, e a levou a Adão. E Adão disse: eis aqui agora o osso de meus ossos e a carne da minha carne; ela se chamará Virago, porque do varão foi tomada. Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe, e se unirá à sua mulher, e os dois serão uma só carne. Ora um e outro, isto é, Adão e sua mulher, estavam nus e não se envergonhavam.”⁹
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