quarta-feira, 3 de setembro de 2025

EVOLUIR

 Muitas vezes me senti um estranho para mim mesmo. Acontece que é natural querer permanecer no patamar que foi alcançado, porém, os pensamentos mudam, as percepções se modificam, os sonhos adquirem novos contornos e até o físico se modifica. A evolução se dá num processo de auto estranhamento. Sim, a vida nos oferece inúmeras versões de nós mesmos. O que fomos ontem nem sempre se encaixa no que somos hoje, e aquilo que parecia definitivo pode perder o sentido com o passar do tempo. Essa estranheza diante da própria história é sinal de evolução. Quando olhamos para trás e nos surpreendemos com nossas escolhas, com o modo como agíamos ou com as palavras que escrevemos, não precisamos sentir vergonha, mas perceber o quanto caminhamos. É natural se estranhar, porque amadurecer significa abandonar antigas formas de pensar, deixar para trás atitudes que já não nos representam e abrir espaço para um novo modo de existir. Esse movimento nem sempre é confortável, pois exige desapego da imagem que tínhamos de nós mesmos, mas é justamente nele que está escondida a beleza da transformação. Crescer é um processo silencioso, feito de pequenas rupturas e grandes aprendizados. É como mudar de pele: o que antes servia já não cabe mais. Essa sensação de não se reconhecer, de se espantar com a própria letra, é prova de que a vida segue pulsando e que não estamos estagnados. O perigo não é se estranhar, mas se acomodar a ponto de nunca mudar. É no espanto com nós mesmos que percebemos a grandeza daquilo que a experiência nos ensinou. Evoluir é também reconciliar-se com as versões antigas, entendendo que elas foram necessárias para que chegássemos até aqui. Não se trata de rejeitar quem fomos, mas de reconhecer que cada etapa teve sua função e agora já cumpriu seu papel. A maturidade é aceitar esse constante processo de reinvenção, sem medo de não se reconhecer. Porque no fundo, cada transformação nos aproxima da essência, que permanece firme apesar das mudanças. O estranhamento é apenas um sinal de que seguimos vivos e em movimento. Ao meu ver, o verdadeiro sentido da vida seja exatamente esse: continuar a se estranhar, até se reconhecer de novo, em uma versão mais inteira e mais verdadeira.

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