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domingo, 24 de setembro de 2023

PSICOLOGIA

 Nas últimas décadas, um número considerável de pessoas da igreja evangélica tem substituído o conselho de pastores, anciãos, irmãos piedosos e da suficiente Palavra de Deus pela “‘psicologia cristã’ – técnicas e sabedoria adquiridas a partir de terapias seculares e aplicadas por profissionais que recebem por seus serviços”[1]. Com isso o movimento conhecido por aconselhamento bíblico tem sido atacado e criticado, por muitas pessoas dentro e fora da igreja.

É fácil entender o motivo da crescente e influente crítica ao aconselhamento bíblico. Antes da década de cinquenta somente pastores “liberais na teologia e na eclesiologia aceitavam as psicologias e psicoterapias”[2]. Segundo Powlison: “No século XX, aconselhamento pastoral se tornou, virtualmente, sinônimo de liberalismo, e esse aconselhamento pastoral estava intelectual e metodologicamente subordinado à psicologia secular”[3].

A influência do liberalismo[4] e de sua marca registrada, o pragmatismo, que segundo John MacArthur “é a noção de que o significado ou o valor é determinado pelas consequências práticas”[5], sobre a teologia e a prática da igreja colocou o aconselhamento bíblico praticado desde a igreja primitiva em risco. Muitas igrejas passaram a se importar mais com aquilo que dá resultado, ou facilita o trabalho, do que com o conteúdo daquilo é praticado na igreja.

Com isso, um ponto de interrogação foi colocado sobre a cabeça de muitos em relação ao aconselhamento bíblico – “o que de fato é aconselhamento bíblico?”.

Basicamente este artigo, que será dividido em cinco partes, se propõe a responder duas perguntas elementares: o que é o aconselhamento bíblico? (parte 1). E, quais são os imperativos teológicos procedentes dele? (parte 2-5).

O objetivo é mostrar que: a) a teologia do aconselhamento bíblico e seus fundamentos são coerentes com todo o conteúdo bíblico e a teologia ortodoxa, levando em consideração um quadro histórico que contempla a Criação, a Queda e a Redenção, tanto no conteúdo quanto no processo do aconselhamento; b) os imperativos teológicos resultam dos fundamentos do aconselhamento, fornecendo tanto o conteúdo quanto os caminhos para a prática do aconselhamento orientado para a glória de Deus e o crescimento espiritual.

Embora se perceba claramente a diferença entre o aconselhamento bíblico dos outros tipos de aconselhamento realizados atualmente pela igreja, o objetivo desse artigo não é atacá-los, nem mesmo defender o aconselhamento bíblico, mesmo que em alguns momentos o contraste entre os modelos de aconselhamento seja evidente. A proposta do autor é destacar os fundamentos do aconselhamento e aquilo que é indispensável para que ele seja praticado com fidelidade.

Tendo assim a expectativa de que o presente artigo esclareça, encoraje e desafie aqueles que têm a tarefa de aconselhar, ou seja, toda a igreja. Especialmente os pastores e líderes que foram chamados para exercer essa função, como modelos do rebanho (cf. 1 Tm 4.12) buscando sempre a excelência e a fidelidade no ministério.

 

1- O que é aconselhamento bíblico?

Há muitas dúvidas a respeito do que é o aconselhamento bíblico e como ele se apresenta nas páginas da Escritura. Por isso esse e os outros artigos se propõem a respondê-las, definindo o conceito e apresentando os fundamentos teológicos e os alvos do aconselhamento bíblico.

 

2- Definição de aconselhamento bíblico

O aconselhamento bíblico está baseado na verdade de que o Deus que se autorrevelou na Criação (Gn 1.1; Sl 19.1-6), e de modo específico, em Sua Palavra (2 Tm 3.16-17; Sl 19.7-9) e na pessoa de Jesus Cristo (Cl 2.9; Hb 1.1-4), não somente se fez conhecido do homem, mas revelou ao homem a Sua vontade. “O aconselhamento bíblico reconhece plenamente que sua epistemologia cresce na pressuposição teísta de um Criador auto-revelador”[6]. Essa revelação abrange tudo o que precisamos saber sobre Ele mesmo, as pessoas e o mundo em que elas vivem. Pedro em sua segunda epístola diz: “Visto como, pelo seu divino poder, nos têm sido doadas todas as coisas que conduzem à vida e à piedade, pelo conhecimento completo daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude” (2 Pe 1.3 – negrito meu).

O que é então aconselhamento bíblico? O aconselhamento bíblico visa glorificar a Deus, por meio de uma cosmovisão teocêntrica, dando ao homem a perspectiva divina sobre seus problemas e situações, conduzindo-o assim a um foco na pessoa de Deus na maneira de pensar e viver. “Assim, qualquer modelo de aconselhamento autenticamente bíblico estará estruturado, projetado e será executado em alegre submissão à imposição bíblica de que nossa vida deve ser vivida completamente para a glória de Deus”[7].

Uma vida centrada em Deus e em Sua Palavra, por sua vez, garante ao homem uma direção de vida superior, dando-lhe conhecimento sobre a vontade de Deus e como ela pode ser efetiva em sua vida, conformando-o à imagem de Jesus Cristo. Isso é aconselhamento bíblico!

Além disso, o aconselhamento bíblico lida com o homem no nível do coração, discernindo seus pensamentos, afeições e vontades, alinhando-as com a Escritura. Ao contrário de outros modelos que oferecem ajuda para o indivíduo, baseando-se em uma antropologia humanista, transferindo a responsabilidade do indivíduo para agentes externos e buscando respostas para o problema do homem em outras fontes de conhecimento. O aconselhamento bíblico está baseado na profunda convicção que “cada um de nós é pessoalmente responsável pelos seus pensamentos, palavras e ações, independentemente de pressões e influências externas”[8].

Esse processo de discernir o coração é realizado no poder do Espírito Santo e da Palavra de Deus, que conferem ao conselheiro e ao aconselhado condições de enxergarem o real problema e o poder necessário para mudança (Jr 17.9-10; Hb 4.12-13). Na verdade esse é o pressuposto que sustenta o ministério daqueles que se dizem conselheiros bíblicos, pois reconhecem a ineficiência do homem para conhecer o próprio coração, em contrapartida com a suficiente obra conjunta do Espírito Santo e da Palavra de Deus operando no homem.

Esta definição de aconselhamento bíblico pode ser vista como uma definição funcional. Apesar disso a abordagem do aconselhamento é profundamente bíblica e teológica, e suas bases estão em toda a Palavra de Deus (cf. Sl 19.7-9; 2 Tm 3.16-17).

Um dos termos utilizados para a atividade do aconselhamento vem da palavra grega νουθετέο (noutheteo) que significa literalmente “colocar na mente”. O objetivo é destacar que o papel do conselheiro é colocar na mente do aconselhado as Escrituras, definindo assim o trabalho do conselheiro e o fruto desse trabalho como aconselhamento bíblico[9]. Esse e outros termos utilizados no NT descrevem a tarefa do aconselhamento e são essenciais para a definição e distinção do aconselhamento bíblico de outros modelos que se propõem a ajudar o homem lidar com seus problemas.

Portanto, funcionalmente o aconselhamento bíblico está baseado na suficiência da Escritura como revelação de Deus. O seu foco está na pessoa de Deus e em Sua glória. Seu objetivo é conformar o homem à imagem de Cristo, conferindo-lhe esperança e poder através do Espírito Santo e da Escritura para efetuar mudança no nível do coração, e satisfação plena em Deus em todas as circunstâncias da vida, vivendo exclusivamente para Sua vontade enquanto lida com seus problemas e ajuda outros da mesma forma (cf. 2 Co 1.3-11; 3.18). E objetivamente o aconselhamento bíblico é colocar na mente do aconselhado a toda-suficiente Palavra de Deus, para que haja mudança de mente e comportamento visando à glória de Deus e o bem do aconselhado.

 

3- O que faz o aconselhamento ser bíblico?

A diferença entre o aconselhamento bíblico e os outros modelos de aconselhamento, inclusive o aconselhamento cristão ou integracionista[10], é sua estrutura alicerçada apenas na suficiência da Escritura. Uma figura que explica essa estrutura encontra-se na Pirâmide Teológica.

A figura representa a seguinte afirmação: “As Escrituras são, única e completamente, a inerrante e legítima Palavra de Deus”[12]. Fonte de autoridade máxima e suficiente para o aconselhamento desde que estudada, interpretada e aplicada corretamente no poder do Espírito de Deus, de modo específico ao aconselhado. Essa verdade mais do que qualquer outra distingue o aconselhamento bíblico de todas as outras práticas de aconselhamento[13].

Deve-se ter em mente que a ideia de uma interpretação correta não significa uma interpretação própria ao leitor (ou conselheiro), mas, uma que é resultante da aplicação dos princípios hermenêuticos e exegéticos ao texto. O significado do texto nunca poderá ser determinado pelo conselheiro, pelo contrário, ele sempre terá o significado que Deus deu a ele.

Nas palavras de Barbara Enter no livro “Mulheres aconselhando mulheres”:

“É Deus quem determina o significado das Escrituras porque Ele é o Autor da Bíblia […] A Bíblia significa o que Deus quer que ela signifique. Cada versículo significa somente o que Ele pretendeu que significasse […] Interpretar as Escrituras nunca se destinou a ser um jogo de suposições, com interpretações que variam de leitor para leitor”[14].

 

Por isso, se qualquer etapa no processo de interpretação ou aplicação da Palavra de Deus for substituída ou suplantada não teremos aconselhamento bíblico. De acordo com o Programa de Treinamento da Associação Brasileira de Conselheiros Bíblicos (ABCB) o nível seis sem os níveis um a cinco não é aconselhamento bíblico. Os níveis um a cinco sem o nível seis são incompletos e ineficazes, pois não estão alicerçados em uma teologia sadia ou não são aplicadas as verdades teológicas que ajudarão no processo de transformação da pessoa[15].

Nesse sentido aconselhamento bíblico não é uma sugestão, uma opinião ou simplesmente um lançar de versículos ao aconselhado, mas sim uma aplicação da Teologia Bíblica assegurada pela inerrância, infalibilidade, inspiração e suficiência das Escrituras (cf. 2 Tm 2.15; 3.16.17).

 


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